A grama do vizinho
Por Silas Gouveia
É comum e até certo ponto normal, principalmente quando não estamos satisfeitos ou felizes com nós mesmos, ou com quem a gente ama ou convive, fazermos comparações com outras pessoas ou situações que enxergamos apenas com o viés da positividade, fechando os olhos ou fazendo ouvidos de mercador, para o lado nebuloso ou negativo das coisas. Existe até um dito popular que resume um pouco disto: “A grama do vizinho é sempre mais verde.”
Recentemente vemos todos reclamarem do time do Galo, a falta de qualidade, falta de técnico e a postura extremamente defensiva quando joga fora de seus domínios. Além disso, reclamamos também do pequeno público que tem prestigiado os jogos do time quando ele é o mandante. É bom salientar que todas as críticas são, de certa forma, justificadas. Nada muito diferente disso. Mas será que não estamos enxergando mais a grama do vizinho que a nossa?
No último jogo contra o Grêmio, grande parte da torcida e também da imprensa reclamou que o Galo teve uma postura muito defensiva no primeiro tempo, praticamente abdicando de jogadas de ataque, sendo assim, foi totalmente dominado pelo adversário, que teve até mesmo um pênalti desperdiçado a seu favor. As críticas foram ainda mais contundentes, quando antes mesmo de completar cinco minutos da segunda fase do jogo, o Grêmio conseguiu chegar ao gol que acabou lhe dando a vitória ao final da partida. As críticas mais ácidas consideraram que time e treinador tiveram uma postura covarde frente ao Grêmio. No jogo contra o Unión la Calera até podemos dizer que houve sim uma atitude um pouco covarde, dado a fragilidade do adversário.
Para justificar as críticas, todos mostravam que após o gol sofrido o Galo adiantou suas linhas de marcação e conseguiu confrontar de forma mais equilibrada o jogo que já estava desfavorável ao Galo. Disseram que se essa postura tivesse sido adotada desde o início do jogo poderíamos ao menos ter conseguido um empate e assim somado ao menos um ponto na classificação. Não concordo com quase nada do que a maioria disse.
O Grêmio é um time já formado e com padrão de jogo estabelecido há quase três anos e seu técnico vai para a sua terceira temporada. Dentro de casa o Grêmio domina mesmo seus adversários, principalmente no primeiro tempo, devido ao seu estilo de jogo e ao esquema de marcação alta e quase sempre de forma tripla ao jogador que tiver a posse de bola. Os times que fizeram marcação alta contra o Grêmio jogando na arena deles quase sempre sofreram dois ou mais gols ainda no primeiro tempo. O jogo do Grêmio contra o Fluminense, vencido de forma até certo ponto surpreendente pelo Fluminense em uma virada espetacular, teve como pano de fundo um início avassalador do Grêmio, quando eles conseguiram fazer três gols em menos de 15 minutos de jogo. A virada do Fluminense foi algo espetacular, mas atípico. E só foi possível porque o Fluminense tem um time jovem, talentoso e já não tinha mais o que perder, a não ser tomar uma sonora goleada.
É o que provavelmente aconteceria com o Galo caso o time não jogasse da forma como jogou no primeiro tempo. Já no segundo tempo, com as alterações feitas pelo técnico deles, o time do Grêmio já não tinha mais condições de fazer valer seu estilo de jogo de marcação alta e constante. Com isso, mais as alterações promovidas pelo Santana no time do Galo, as ações puderam ser conduzidas de forma mais equilibrada. A vitória do Grêmio era uma situação que tentava ser evitada, mas é claro que todos sabiam que seria uma tarefa difícil de se conseguir. E por isso acho que grande parte das críticas foram exageradas. Fizemos um jogo que era possível, dado as características de nosso elenco, a falta de opções de banco que temos e ao pouco tempo de implantação de um estilo de jogo pelo Santana. Mas como já andamos meio ressabiados com nosso time e, principalmente, com a postura de nossa diretoria, aumentamos o tom de nossas críticas.
Para corroborar um pouco mais do que afirmo, vamos ao outro lado do mesmo jogo. O Grêmio, que nos últimos anos conquistou vários títulos importantes nos últimos anos, inclusive uma Libertadores e o Campeonato Gaúcho deste ano, tinha todas as justificativas do mundo para manter uma média excelente de público e renda, mesmo sendo um jogo de uma noite de sábado. Mas o que vimos foi um público pagante de 13.714 torcedores e uma renda de R$444.432,00. No jogo do Santos contra o Inter, público de 12.756 e renda de R$479.440,00. Públicos e rendas não muito diferentes do que o Galo tem conseguido, mesmo com toda desconfiança e descrédito que a torcida parece estar passando atualmente.
A grama do vizinho pode estar mais verde, mas a verdade é que ela é diferente. Algumas são até sintéticas e outras parecem ser pintadas. E nem sempre de verde, ao que tudo indica pelos fatos recentemente descobertos. Só espero que a diretoria saiba cuidar melhor de nossa grama.